A Biografia e Vida de Gil Vicente

 

I – Quem foi Gil Vicente?

A biografia de Gil Vicente ainda permanece um mistério em muitos aspectos. Não há provas definitivas que possam estabelecer com segurança sua identidade. Calcula-se que tenha nascido por volta de 1465, em lugar ignorado.

Há poemas seus no Cancioneiro geral, organizado por Garcia de Resende e publicado em 1516. A sua carreira teatral, por outro lado, começou de forma inusitada: por ocasião do nascimento do filho de D. Manuel e D. Maria de Castela, em 1502, ele entrou nos aposentos reais e, diante da corte surpresa, declamou um monólogo que tinha escrito em castelhano, à semelhança de Juan del Encina, o Monólogo do vaqueiro (ou Auto da visitação), em que um simples homem do campo expressa sua alegria pelo nascimento do herdeiro, desejando-lhe felicidades. A interpretação entusiasmou a corte, que lhe pediu a repetição na passagem do Natal. Gil Vicente atendeu aos apelos, porém compôs um outro texto, o Auto pastoril castelhano, que também fez sucesso. Tinha início, assim, uma brilhante carreira, que se estenderia por mais de trinta anos. Sua última peça – Floresta de enganos – é de 1536, e depois dessa data não há mais notícias suas. Preparava um edição de sua obra quando faleceu. Luís Vicente, seu filho, publicou em 1562 a Copilaçam de todalas peças de Gil Vicente, que deixa muito a desejar por ser incompleta e pelas alterações em vários textos.

O teatro vicentino é basicamente caracterizado pela sátira, criticando o comportamento de todas camadas sociais: a nobreza, o clero e o povo.

A sua participação na vida da corte foi intensa e variada, tendo inclusive recebido prêmios de D. João III. Várias peças suas circularam sob forma de cordel e, por ocasião do estabelecimento da Inquisição de Portugal, algumas foram proibidas.

Dessa forma, pouco se conhece de concreto sobre a vida do homem Gil Vicente, mas as numerosas peças que nos restaram bastam para avaliar o talento indiscutível do escritor Gil Vicente, justamente considerado o fundador do teatro português.

 

II – Classificação das peças

Gil Vicente escreveu 44 peças, sendo 17 escritas em português, 11 e castelhano e 16 bilíngües. Apenas para efeito didático, já que muitas delas não apresentam diferenças bem nítidas, podemos agrupar as principais em dois grupos, de acordo com sua preocupação dominante.

peças de crítica social: Quem tem farelos?; Auto da Índia; Farsa de Inês Pereira, O Velho da horta. Outras peças: Farsa dos almocreves, Farsa do escudeiro etc.

Peças religiosas: Auto da Mofina Mendes (ou Os Mistérios da Virgem); Auto da alma; Trilogia das barcas, composta do Auto da barca do inferno, Auto da barca do purgatório, Auto da barca da glória. Outras peças: Breve sumário da história de Deus, Auto da sibila Cassandra, Auto da feira, Auto da fé etc.

Há ainda outros tipos de peças, que podem ser reunidas da seguinte maneira: peças de temas romanescos, tais como Amadis de Gaula, D. Duardos e Comédia do viúvo, em que o assunto é extraído geralmente das novelas de cavalaria; peças auto pastoris, como Auto da visitação, Auto pastoril castelhano, Auto dos reis magos etc., que colocam em cena pastores e pastoras, quase sempre desenvolvendo algum motivo religioso; peças alegóricas, como Nau de amores, O Templo de Apolo, Cortes de Júpiter etc., que são fantasias de assuntos variados.