A origem da palavra barroco tem causado muitas discussões. Dentre as várias posições, a mais aceita é a de que a palavra se teria originado do vocábulo espanhol barrueco, vindo do português arcaico e usado pelos joalheiros desde o século XVI, para designar um tipo de pérola irregular e de formação defeituosa, aliás, até hoje conhecida por essa mesma denominação. Assim, como termo técnico, estabeleceria, desde seu início, uma comparação fundamental para a arte: em oposição à disciplina das obras do Renascimento, caracterizaria as produções de uma época na qual os trabalhos artísticos mais diversos se apresentariam de maneira livre e até mesmo sob formas anárquicas, de grande imperfeição e mal gosto.(Suzy Mello, Barroco. São Paulo, Brasiliense, 1983. p.7-8)
No início do século XVII, o Classicismo já estava perdendo a força. Depois de dominar por um século o palco da literatura ocidental, o Classicismo esgotou as renovações trazidos do Renascimento e pouco a pouco foi deixando de ser centro dos acontecimentos culturais. Surgiu, então, o Barroco.
O barroco na arte marcou um momento de crise espiritual da sociedade européia. O homem do século XVII era um homem dividido entre duas mentalidades, duas formas de ver o mundo. O Barroco é fruto da síntese entre duas mentalidades, a medieval e a renascentista, o homem do século XVII era um ser contraditório, tanto que ele se expressou usando a arte.
Em Portugal, o Barroco ou Seiscentismo tem seu início em 1580 com a unificação da Península Ibérica, o que acarretará um forte domínio espanhol em todas as atividades, daí o nome Escola Espanhola, também dado ao Barroco lusitano. O Seiscentismo se estenderá até 1756, com a fundação da Arcádia Lusitana.
No Brasil, o Barroco tem seu marco inicial em 1601 com a publicação do poema épico prosopopéia, a primeira obra, propriamente literária, escrita entre nós, da autoria do português, radicado no Brasil, Bento Teixeira. O final do Barroco brasileiro só concretizou em 1768, com a publicação das Obras poéticas de Cláudio Manuel da Costa . No entanto, como o Barroco no Brasil só foi mesmo reconhecido e praticado em seu final (entre 1720 e 1750), quando foram fundadas várias academias literárias, desenvolveu-se uma espécie de Barroco tardio nas artes plásticas, o que resultou na construção de igrejas de estilo barroco durante o século XVIII.
O Barroco no Brasil foi um estilo literário que durou do século XVII ao começo do século XVIII, marcado pelo uso de antíteses e paradoxos que expressavam a visão do mudo barroco numa época de transição entre o teocentrismo e o antropocentrismo.
Momento Histórico
Lisboa era considerada a capital mundial da pimenta, a agricultura lusa era abandonada. Com a decadência do comércio das especiarias orientais observa-se o declínio da economia portuguesa. Paralelamente, Portugal vive uma crise dinástica: em 1578 D. Sebastião desaparece em Alcácer-Quibir, na África; dois anos depois, Felipe II da Espanha consolida a unificação da Península Ibérica.
A perda da autonomia e o desaparecimento de D. Sebastião originam em Portugal o mito de Sebastianismo (crença segundo qual D. Sebastião voltaria e transformaria Portugal no Quinto Império). O mais ilustre sebastianista foi sem dúvida o Pe. Antônio Vieira, que aproveitou a crença surgida nas "trovas" de um sapateiro chamado Gonçalo Anes Bandarra.
A unificação da Península veio favorecer a luta conduzida pela Companhia de Jesus em nome da Contra-Reforma: o ensino passa a ser quase um monopólio no campo científico-cultural. Enquanto a Europa conhecia um período de efervescência no campo científico, com as pesquisas e descobertas de Francis Bacon, Galileu, Kepler e Newton.
Com o Concílio de Trento (1545-1563), o Cristianismo se divide. De um lado os estados protestantes (seguidores de Lutero introdutor da Reforma) que propagavam o "espírito científico", o racionalismo clássico, a liberdade de expressão e pensamento. De outro, os redutos católicos (a Contra-Reforma) que seguiam uma mentalidade mais estreita, marcada pela Inquisição (na verdade uma espécie de censura) e pelo teocentrismo medieval.
O quadro brasileiro se completa, no século XVII, com a presença cada vez mais forte dos comerciantes, com as transformações ocorridas no Nordeste em conseqüência das invasões holandesas e, finalmente, com o apogeu e a decadência da cana-de-açúcar.
Características
O culto da forma manifesta-se tanto na literatura quanto nas artes plásticas do Barroco. Neste detalhe de um grupo de esculturas de Aleijadinho que representa a Última Ceia, não há lugar para a expressão serena das imagens religiosas; os apóstolos revelam intensa agitação, traduzida nos gestos e olhares que trocam a respeito do que acabaram de ouvir de Cristo.
Algumas características da linguagem barroca merecem especial atenção pela sua peculiaridade e pelo uso que sendo feito de algumas delas em escolas posteriores.
"Nasce o sol, e não dura mais que um dia,
Depois da Luz se segue a noite escura,
Em tristes sombras morre a formosura,
Em contínuas tristezas a alegria.
Porém, se acaba o Sol, por que nascia?
Se é tão formosa a Luz, porque não dura?
Como a beleza assim se transfigura?
Como o gosto da pena assim se fia?
......................................................................
Começa o Mundo enfim pela ignorância,
E tem qualquer dos bens por natureza
A firmeza somente na inconstância."
(Gregório de Matos)
O tema da fugacidade do tempo, da incerteza da vida, é desenvolvido por meio de um jogo de imagens e idéias que se contrapõem, num sistema de oposições: nasce x não dura; luz x noite escura; tristes sombras x formosura; acaba x nascia.
O espírito Barroco é cabalmente expresso no célebre dilema do 3º ato de Hamlet, de Shakespeare: "To be or not to be, that is the question". ("Ser ou não ser, eis a questão...")
"...Gozai, gozai da flor da formosura,
Antes que o frio da madura idade
Tronco deixe despido, o que é verdura..."
"Lembra-te Deus, que és pós para humilha-te,
E como o teu baixel sempre fraqueja,
Nos mares da vaidade, onde peleja,
Te põe a vista a terra, onde salvar-te..."
Podemos notar dois estilos no barroco literário: o Cultismo e o Conceptismo.
O aspecto exterior imediatamente visível no Cultismo ou Gongorismo é o abuso no emprego de figuras de linguagem como as metáforas, antítese, hipérboles, hipérbatos, anáforas, paronomásias, etc...
"O todo sem a parte não é o todo;A parte sem o todo não é parte;
Mas se a parte o faz todo, sendo parte,
Não se diga que é parte, sendo o todo.
Em todo o Sacramento está Deus todo,
E todo assiste inteiro em qualquer parte,
E feito em partes todo em toda a parte,
Em qualquer parte sempre fica todo."
(Gregório de Matos)
A O SILOGISMO: Dedução formal tal que, postas duas proposições, chamadas premissas, delas se tira uma terceira, nelas logicamente implicada, chamada conclusão. Assim, temos como exemplo: Todo homem é mortal (premissa maior); ora, eu sou homem (premissa menor); logo, eu sou mortal (conclusão).
Observe a construção dos tercetos finais de um soneto sacro de Gregório de Matos que, referindo-se ao amor de Cristo diz:
"Mui grande é o vosso amor e o meu delito;Porém pode ter fim todo o pecar,
E não o vosso amor, que é infinito.
Essa razão me obriga a confiar
Que, por mais que pequei, neste conflito
Espero em vosso amor de me salvar."
Estes versos encobrem a formulação silogística, como segue:
- Premissa maior: O amor infinito de Cristo salva o pecador.
- Premissa menor: Eu sou um pecador.
- Conclusão: Logo, eu espero salvar-me.
B O SOFISMA: É o argumento que parte de premissas verdadeiras e que chega a uma conclusão inadmissível, que não pode enganar ninguém, mas que se apresenta como resultante de regras formais do raciocínio, não podendo ser refutado. É um raciocínio falso, elaborado com a função de enganar.
Ex.: Muitas nações são capazes de governarem-se por si mesmas; as nações capazes de governarem-se por si mesma não devem submeter-se às leis de um governo despótico. Logo, nenhuma nação deve submeter-se às leis de um governo despótico.
Cultismo e Conceptismo são dois aspectos do Barroco que não se separam; antes, superpõem-se como as duas faces de uma mesma moeda. Às vezes, o autor trabalha ao nível de palavra, da imagem; busca mais argumento, o conceito. Nada impede que o mesmo texto tenha, simultaneamente, aspectos Cultistas e Conceptistas. Com os riscos inerentes às generalizações abusivas, diz-se, didaticamente, que o Cultismo é predominante na poesia e o Conceptismo, predominante na prosa.
Barroco As Origens da Cultura Brasileira
O nosso primeiro e decisivo estilo artístico e literário foi o Barroco. É contemporâneo dos alicerces mais antigos da sociedade e da cultura brasileira, ou seja, da formação da família patriarcal nos engenhos de cana de Pernambuco e da Bahia, da economia apoiada no tríptico monocultura-latifúndio-trabalho escravo, bem como dos primórdios da educação brasileira, nos colégios jesuíticos. Daí sua importância, e daí, também, as projeções que esse período subseqüentes, até os nossos dias.
O Barroco é originário da Itália e da Espanha e sua expansão para o Brasil deu-se a partir da Espanha, centro irradiador desse estilo, para a Península Ibérica e América Latina.
Para isso contribuíram, decisivamente, os seguintes fatos:
Os limites cronológicos do Barroco no Brasil são:
Representantes
Vieira nasceu em Lisboa, em 1608. Com sete anos vem para a Bahia; em 1623 entra para a Companhia de Jesus. Quando Portugal se liberta da Espanha (1640), retorna à terra natal, saudando o rei D. João IV, de quem se tornaria confessor. Politicamente, Vieira tinha contra si a pequena burguesia cristã, por defender o capitalismo judaico e os cristãos-novos; os pequenos comerciantes, por defender um monopólio comercial; os administradores e colonos, por defender os índios. Essas posições, principalmente a defesa dos cristãos-novos, custam a Vieira uma condenação pela Inquisição: fica preso de 1665 a 1667. Falece em 1697, no Colégio da Bahia.
Podemos dividir sua obra em:
Profecias constam de três obras: História do futuro, Esperanças de Portugal e Clavis prophetarum, em que se notam Sebastianismo e as esperanças de Portugal se tornar o Quinto Império do Mundo, pois tal fato estaria escrito na Bíblia.
Cartas são cerca de 500 cartas, que versam sobre o relacionamento entre Portugal e Holanda, sobre a Inquisição e os cristãos-novos.
Sermões são quase 200 sermões. De estilo barroco conceptista o pregador português joga com asa idéias e os conceitos, segundo os ensinamentos da retórica dos jesuítas. Um de seus principais sermões é o Sermão da sexagésima (ou A palavra de Deus), pregado na Capela Real de Lisboa em 1655.
"... Não fez Deus o céu em xadrez de estrelas, como os pregdores fazem o sermão em xadrez de palavras. Se de uma parte está branco, da outra há de estar negro; se de um parte dizem luz, da outra hão de dizer sombra; se de uma parte dizem desceu, da outra hão de dizer subiu. Basta, que não havemos de ver num sermão duas palavras em paz? Todas hão de estar sempre em fronteira com o seu contrário? ..."
(Fragmento do Sermão da Sexagésima do Padre Antônio Vieira)
Dentre sua obras mais conhecidas, destacam-se ainda: Sermão pelo bom sucesso das armas de Portugal contra as de Holanda e o Sermão de Santo Antônio.
Antigo interior da igreja de Nossa Senhora da Ajuda (Salvador, Bahia), onde vieira proferiu seu Sermão pelo bom sucesso das armas de Portugal contra as Holandas.
Orador sacro português. Nasceu em 1644. Um dos maiores clássicos da língua. Obras: Luz e Calor, Nova Floresta etc. Morreu em 1710.
O escritor Gregório de Matos Guerra, nascido na Bahia, provavelmente a 20 de dezembro de 1633, Gregório de Matos firma-se como o primeiro poeta brasileiro. Após os primeiros estudos no Colégio de Jesuítas, vai para Coimbra, onde se gradua em Direito. Formado, vive alguns anos em Lisboa exercendo a profissão; por sua sátiras, é obrigado a retornar à Bahia. Em sua terra natal, é convidado a trabalhar com o jesuítas no cargo de tesoureiro-mor da Companhia de Jesus. Ainda por sua sátiras, abandona os padres e é degredado para Angola; já bastante doente volta ao Brasil, mas sob duas condições: estava proibido de pisar em terras baianas e de apresentar sua sátiras. Morreu em Recife, no ano de 1696.
Apesar de ser conhecido como poeta satírico daí o apelido "Boca do Inferno" , Gregório também praticou, e com esmero, a poesia religiosa e a lírica. Cultivou tanto o estilo cultista como o conceptista, apresentando jogo de palavras ao lado de raciocínios sutis, sempre como o uso abusivo de linguagem.
Sua obra permaneceu inédita até o século XX, quando a Academia Brasileira de Letras, entre 1923 e 1933, publicou seis volumes, assim distribuídos: I. Poesia sacra; II. Poesia lírica; III. Poesia graciosa; IV e V. Poesia satírica; e VI. Últimas.
- Poeta religioso: Gregório coloca-se dinate de Deus, como um pecador, pedindo perdão por seus erros e confiante na misericórdia divina.
"Eu sou, Senhor, Ovelha desgarrada;
cobrais: e não queiras, Pastor Divino,
perder na nossa ovelha a vossa glória."
- Poeta satírico: criticava os letrados, os políticos, a corrupção, o relaxamento dos costumes, a cidade da Bahia, ...
"Que os brasileiros são Bestas,
e estão sempre a trabalhar
toda a vida, por manter
Maganos de Portugal."
- Poeta lírico: seu lirismo amoroso se define pelo erotismo, revelando uma sensualidade ora grosseira, ora de rara fineza. Gregório de Matos foi o primeiro poeta que admirou e glorificou a mulata:
"Minha rica mulatinha
Desvelo e cuidado meu."
É autor de Prosopopéia, poema épico em decassílabos, dispostos em oitava rima, publicado em 1601. Apesar da deficiência, o texto é visto por alguns críticos como iniciador do Barroco no Brasil. Durante muito tempo pensou-se que fosse natural de Recife, cidade descrita no poema, que narra um naufrágio sofrido por Jorge Albuquerque Coelho, donatário da Capitania de Pernambuco. Hoje se admite que teria nascido em Portugal, embora tivesse morado a maior parte da vida no Recife.
O primeiro escritor nascido no Brasil a ter um livro publicado, Manuel Botelho de Oliveira (1636-1711) nasceu em uma família afastada de Salvador e estudou Direito em Coimbra. Foi vereador, advogado e agiota. Escreveu Música do Parnaso, o primeiro livro impresso de autor nascido no Brasil. A sua fama perdurou como autor do poemeto (silva) A Ilha da Maré, apontando como precursor do nativismo pitoresco.
Links:
Gregório de Matos: Site dedicado ao poeta Gregório de Matos, com biografia e variedade de textos eletrônicos, entre eles muitos sonetos. http://www.e-netcom.br/seges/grego.html
Lista de Autores do Repositório de Literatura: Espécie de biblioteca dedicada à Literatura em português, oferece links para páginas dos mais diversos autores, incluindo biografias e textos eletrônicos. Entre eles, Tomás Gonzaga e Claúdio Manuel da Costa. http://www.cr-sp.rnp.br/literatura/autores.html
O Barroco: O Barroco foi o primeiro estilo de época da literatura brasileira: Gregório de Matos, Pe Antônio Vieira e o homem do Seiscentismo são estudados neste site. http://www.geocities.com/Athens/Forum/7567/lite0005.htm
De Vila Rica a Ouro Preto: Site dedicado à cidade de Ouro Preto, onde se encontra o maior e mais bonito acervo de barroco brasileiro. http://degeo.ufop.br/op/vila.htm