Simão Bolívar

 

Estamos no início do século XX: e já, a mais de três séculos, a Espanha explora suas colônias na América Latina, negando a todos os indígenas e aos crioulos (descendentes de pais europeus e levados para a América espanhola), qualquer possibilidade de participação na vida pública. A rígida vigilância dos governadores espanhóis torna extremamente difícil qualquer tentativa de rebelião. Todavia, afinal, o engenho de um único homem, patriota fervoroso, de natureza resoluta e apaixonada, faz com que os países da América do Sul consigam libertar-se da escravidão. O herói chamado "O Libertador" (El Libertador) é Simão Bolívar.

Simão Bolívar nasceu em Caracas, capital da Venezuela, em 1783 e viveu longos anos na Europa. Cumpridos os primeiros estudos, em Madri, seguiu depois para Paris. No início do século passado, foi à Itália, em Roma, e aqui, na sagrada terra do Aventino, jurou consagrar toda a sua vida à santa causa da independência americana.

As vicissitudes políticas da Espanha, naquela época, eram turvas e confusas e, naturalmente, mesma desordem repercutia também nas colônias latinas.

E como, desde muito tempo, os germes da rebelião minavam a alma dos indígenas, sobretudo dos crioulos, gente mais ou menos culta e inteligente, os povos oprimidos começaram a agitar-se.

Em Caracas, os primeiros movimentos revolucionários explodiram em 1810. Os patriotas eram chefiados pelo general Francisco Miranda, "o aventureiro da liberdade", que chamou a si Bolívar, e o fez ingressar no exército venezuelano, com o posto de coronel. Miranda, após 13 meses de governo da Nova República da Venezuela, foi obrigado a capitular, sob os duros golpes do general espanhol Monteverde.

Em 1810 os crioulos (espanhóis nascidos na América) destituíram o governador e capitão geral Vicente Emparán, integrando uma Junta Conservadora dos Direitos de Fernando VII, eufemismo que ocultava verdadeiras intenções de independência política. Com a patente de coronel foi a Londres para arregimentar apoio para a revolução venezuelana. Na capital inglesa encontrou-se com Francisco de Miranda e o convidou para regressar à Venezuela. Perdida a primeira República, obteve passaporte para Curaçao, de onde viajou para Cartagena das Índias (atual Colômbia). Ali publicou o Manifesto de Cartagena (2 de novembro de 1812), no qual criticava a irresoluta atuação de Miranda, que conduziu a capitulação; e na Memória aos cidadãos de Nova Granada (15 de dezembro de 1812), convidava-os a acompanhá-lo para libertar a Venezuela.

Mas nem tudo de sua obra ficou perdido, porque Bolívar passou à ação. Ele não conheceu repouso em sua luta e, refugiando-se em Nova Granada, reuniu logo, em torno de si, os exilados e os voluntários de todas as nações, inflamando com sua palavra, os corações, pelo sagrado amor à liberdade. Aos valentes que o acompanharam, ele lhes deu trabalho, fadiga e vida dura, mas seu entusiasmo excitou aqueles poucos homens, que realizaram verdadeiros prodígios, tanto que, em 1813, pôde empreender sua primeira campanha de desforra, que ficou célebre na História.

Aos massacres, às violências, às crueldades dos espanhóis, Bolívar respondeu com uma famosa proclamação, que revela a força desesperada dos povos que invocavam seu direito de resistir. "Espanhóis, contem com a morte, ainda que inocentes! Americanos, contém com a liberdade, ainda que culpados!"

Com este brado nos lábios e no coração, Bolívar, guiando através de regiões desoladas e agrestes um punhado de soldados cansados, maltrapilhos famintos, com poucas armas, mantidos apenas pelo entusiasmo, entrou de novo em Caracas reerguendo o abatido lábaro da República Independente. Mas a luta não terminara: o comandante espanhol, que ainda dominava algumas partes do país, retomou uma guerra sem quartel, semeando, em seu caminho, violências e massacres. Em fins de 1814, de novo a Venezuela teve que ceder diante da força dos espanhóis dominadores. O Libertador, obrigado a fugir para o exílio, refugiou-se na ilha de Jamaica e, daí, para o Haiti, procurando organizar uma nova insurreição. Não lhe importava haver conhecido a derrota: ele devia conduzir à civilização sua gente, restituir a liberdade à sua pátria.

Reconquistada a capital, Bolívar governou através de três Secretarias de Estado. Os triunfos dos realistas o obrigam a viajar para Cartagena das Índias e, um ano depois, para a Jamaica, onde tornou conhecida sua famosa Carta de Jamaica (1815). Em Angostura (atual Cidade Bolívar) expôs seu plano político, apresentando um projeto de constituição onde propunha a criação de um grande estado, sob o nome de Grande Colômbia. Bolívar criou o Conselho de Estado e o Conselho de Governo. Instalou na cidade o segundo congresso da Venezuela (1819). O Discurso de Angostura é a sua peça de oratória mais importante. Faz uma análise sociológica dos venezuelanos, pronuncia-se contra a escravidão e pela democracia; mantém sua preferência pela centralização política e administrativa e propõe um poder moral para prevenir a corrupção administrativa. Eleito presidente do país, se dirigiu a Nova Granada. Empreendeu a ‘Campanha dos Andes’ que culminou com a batalha de Boyacá, a 7 de agosto de 1819, e três dias depois entrou vitorioso em Bogotá. Neste mesmo ano Constituiu a República da grande Colômbia, foi em auxílio dos peruanos insurretos e conseguiu libertá-los do jugo espanhol, fundando dois novos estados: o Peru, de que se tornou ditador, e o Alto Peru, que, em sua honra, assumiu o nome de Bolívia. Em 1820 assinou um tratado de armistício com o espanhol Pablo Morillo, que fracassou, o que levou ao recrudescimento da guerra que terminou na batalha de Carabobo e pôs fim ao domínio espanhol na Venezuela.

A Antônio José de Sucre, lugar-tenente de Bolívar, coube a incorporação de Guayaquil à Colômbia e a libertação de Quito. Em 1824, depois da batalha de Ayacucho, a América do Sul ficava livre do domínio espanhol e as rebeliões de Chuquisaca e La Paz levaram à criação da Bolívia, cuja Constituição foi redigida por Bolívar. Em 1826 o Peru nomeou-o presidente vitalício, mas o Libertador não aceitou.

Em 1826, convocado o Congresso dos Estados Libertadores, em Panamá, ele propôs reunir todas as novas nações em uma só confederação. Mas foi acusado de desejar um governo tirânico, personalista, e a suspeita e a desconfiança armaram os braços dos conspiradores, que atentaram contra sua vida. Amargurado com tanta iniqüidade e incompreensão, Bolívar apresentou várias vezes demissão, mas, sempre, chamado por aqueles que ainda acreditavam nele, soube recalcar a amargura no fundo do coração, para recomeçar a lutar pelo bem de sua pátria. Afinal, porém, sua decisão foi irrevogável porque disse ele ao partir para o exílio: — "Eu não tenho mais pátria a oferecer meu sacrifício. Os tiranos do meu país tiraram-me a pátria".

Retirando-se à vida privada, pobre, sozinho, renegado pelos seus concidadãos, Bolívar morreu em dezembro de 1830.

Na história da América do Sul, a figura de Simão Bolívar ocupa lugar de destaque. Realmente, depois da morte da esposa, ocorrida em 1803, deu toda sua vida pela independência, não só do seu país mas também por outras nações da América do Sul. Esteve sempre pronto para esquecer as ofensas recebidas, assim que verificava que sua presença e as suas qualidades de homem político poderiam ajudar uma nação a tornar-se independente dos dominadores estrangeiros.